sábado, 12 de junho de 2010

O Outro Lado (parte 3)

Enquanto eu caminho em sua direção, ele tenta levantar-se com imensurável dificuldade com o objetivo de fugir novamente. Não consigo entender o porquê, mas, não pensei duas vezes ao segurá-lo pelo braço.
Ele tomba e apóia-se na parede. Eu não entendo, ele parece fraco o suficiente para não conseguir ficar em pé, e, apoiando-se na parede, continua de costas para mim.
- O quê há em seu rosto? Qual mistério poderia ser revelado através de sua face?
A chuva continua caindo lá fora, a sala está tão escura quanto meu quarto, mas agora, aquele misterioso homem parece não ter a mesma força para manipular as sombras.
Deslizo minhas mãos pelos seus longos e dourados cabelos, tão reluzentes diante dos flashes de luz emanados pelos relâmpagos. Toco o seu ombro, ele estremece como se estivesse mais aterrorizado que eu. Aos poucos vou passando por baixo do seu braço esquerdo e me coloco entre ele e a parede. Eu não sei exatamente o que fazer, uma longa mecha de cabelo continua impedindo-me de ver seu rosto. Eu a toco delicadamente e ele geme e treme. O que será que há por baixo daquela bela mecha? Essa dúvida também me faz estremecer, mas algo em mim diz que eu realmente preciso fazer, eu preciso saber quem ele é!
Eu levo a minha mão ao seu rosto, ele tenta evitar, mas não tem forças para me fazer parar. Acaricio sua face com toda doçura do meu coração, na tentativa de fazê-lo sentir-se seguro. Não há o que temer... Ou estou enganada?
Aos poucos vou colocando seus cabelos de lado e descobrindo uma pele macia e fria. Através do toque não consigo detectar nenhuma cicatriz ou algo parecido.
Agora sua face está totalmente descoberta, mas a minha visão continua confusa devido à escuridão. Ele tenta vira-la, mas eu o seguro firmemente e com a luz do primeiro raio caído, pude, enfim, contemplar o rosto mais belo que já vi em toda a minha vida.
Sua pele é clara e delicada, nariz e boca bem desenhados; seus olhos são azuis e intensos, contudo, é dono de uma expressão tão doce e tão triste. Seus olhos percorrem meu corpo e meu rosto, parecia querer memorizar cada traço na esperança de não esquecer-se jamais. Ele toca meu cabelo tão longo quanto o dele, toca a minha boca, minhas mãos, com uma sofreguidão que não consigo expressar. Por um momento olhamos um para o outro fixamente, seu olhar tem algo diferente, parece cheio de angústia e saudade, de alguma forma enche meu coração de dor e sofrimento. Mas por que eu sofro por alguém que não conheço? Bem, a resposta vem em seguida.
Inesperadamente, ele me toma em seus braços e aperta-me contra seu peito de tal maneira, que eu posso ouvir as batidas do seu coração. Ele aproxima seus lábios ao meu ouvido e sussurra. Eu não consigo entender o que está dizendo, mas meu corpo parece obedecer perfeitamente as palavras proferidas pelo “belo misterioso”. Seus batimentos cardíacos misturam-se ao som que sai da sua boca, como dois corpos em uma valsa enfeitiçada, me deixando tonta e fraca.
Caímos de joelhos, abraçados. Por algum motivo ele não me solta, mas aquela espécie de ritual continua. Meus pensamentos estão se perdendo em meio a suavidade do ritmo do seu coração, meu corpo está ficando leve...
Escuridão!
Repentinamente abri meus olhos. Estava em um lugar totalmente diferente. Estava em um salão enorme, com grandes paredes rústicas e perfeitamente decoradas para uma festa. Ouço uma música estranha e vejo várias pessoas. As mulheres estão usando longos e pesados vestidos - os mesmo utilizados nos períodos medievais - os homens estão vestindo roupas que me fazem lembrar aquele estranho violinista que invadiu meu quarto enquanto eu dormia. Estou me sentindo em um baile a fantasia, mas no fundo, sinto que há algo errado. Caminho pelo local na tentativa de identificar onde eu estou, olho em volta, tento reconhecer as pessoas, mas, tenho a impressão de que ninguém me vê! Contudo, durante a caminhada, descubro algo mais intrigante.
No meio do salão, entre tantas pessoas felizes e sorridentes, entre tantos casais dançando, eu vejo algo me faz estremecer, paralisar. Eu vejo a mim mesma como se estivesse olhando para o meu reflexo em um espelho.
Penso estar louca! Estou diante de “mim”, vestida com esses trajes de outra época dançando com o mesmo rapaz belo e misterioso que estava em meu quarto tocando violino para eu dormir. Só pode ser uma brincadeira, ou eu perdi completamente o juízo!
Com os olhos cheios de lágrimas e tomada por um profundo desespero, caminho na direção daquele casal decidida a perguntar-lhes o que está havendo! Que brincadeira absurda! Quem está fazendo isso comigo?
Eu tento chamar a atenção de ambos, grito, choro, tento tocá-los, mas, é inútil, eles não se dão conta da minha presença! Continuam dançando, conversando, sorrindo, como se eu não estivesse ali! Cubro meu rosto com as mãos e choro como uma criança.
Logo, sinto uma mão tocar-me o ombro, olho para trás, é o mesmo rapaz dono daquele olhar tristonho. Eu estou a ponto de enlouquecer, mas, ele me olha com o mesmo olhar doce e me abraça. Eu sinto meu corpo flutuar, e, em seguida, uma nova sensação de paz acalenta meu coração. Nesse momento consigo entender o que está acontecendo, sou capaz entender o que o trouxe a mim e o porquê de tanta dor naqueles olhos melancólicos.

...

2 comentários:

  1. Caramba, está ficando cada vez melhor!
    Que loucura hein!?De onde vc tirou insiração para essa estória?
    Quero ler como termina...
    Abraçoos

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  2. Lari esta mesmo ficando cada vez mais surpreendente e mistérioso.
    Adorei.

    Beijos Soturnos

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